sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Sobre liberdade e autonomia,
temas afeitos à Bioética, segue reflexão em forma de colóquio
com o texto de Vladimir Safatle publicado na folha de São Paulo do dia 27 jan.2017: 

A modernidade nos acostumou à ideia de liberdade como expressão da autonomia individual. Hoje, ela nos é uma ideia tão natural que parece simplesmente impossível pensar de outra forma. 

         De fato, exige um pouco de atenção, não é fácil fazer 
distinção entre os conceitos na prática...
Nossos professores procuram criar alunos autônomos, os pais lutam por terem filhos autônomos, os psicólogos agem para reconduzir seus pacientes à condição de sujeitos autônomos, a democracia pede por cidadãos autônomos.
                                                                  O que é ser livre então? 

[...] seríamos livres quando fôssemos capazes de nos autogovernar, de sermos os legisladores de nós mesmos, de estarmos sob a jurisdição de nós mesmos. [...] Se não podemos dar para nós mesmos nossa própria lei, estaríamos em situação de alienação e servidão, pois seríamos dirigidos por um outro.

Já se falou da razão como um tribunal. Mas nem sempre se falou que tal tribunal nos ensina, entre tantas outras coisas, que nossa liberdade seria a capacidade adquirida de se mover entre a cadeira do juiz, o olhar do júri, a fala do acusador e o peso do acusado, sem em nenhum momento se perder.

[...] um dos maiores milagres dessa concepção foi nos fazer acreditar que liberdade é a crença de que entre as ações e as razões, entre os atos e as leis, há uma identidade absoluta de direito, pois todos eles são "meus".


E quando as coisas não acontecem de acordo com as "leis" que 
estabeleci para mim como corretas e justas? 

[...] é, de fato, um atentado à minha liberdade? Não haveria entre nós uma outra concepção de liberdade, mais difícil de enxergar, para a qual sou livre quando sou capaz de me abrir àquilo que não controlo completamente, àquilo que não se submete à lei que tomei por minha?
                                                                Onde está a diferença?? 

Essa outra concepção não dirá que liberdade é autonomia. Ela dirá que liberdade é saber que há sempre um outro que me causa uma alteridade profunda que me afeta, que por isso minhas ações nunca são completamente minhas.
Heteronomia então ao invés de autonomia? 
Apenas aceito a norma dos outros? 
Como não se sentir sob o comando do outro?

[...] nem sempre essa heteronomia é sinônimo de servidão. Ou seja, liberdade é abrir-se a uma heteronomia sem servidão. Seria melhor pensar assim. Isso nos deixaria mais aptos a ouvir aquilo que nos atravessa sem nunca adquirir a forma de nós mesmos. 
                        Alteridade significa admitir o outro, 
                       pois é esse outro que "me" identifica, 
                         "eu" existo porque alguém outro 
                       me reconhece como seu semelhante. 
                  Portanto, não se trata de servir a um outro, 
                            mas sim, de me relacionar com ele. 
                   A liberdade entendida com o capacidade de autodeterminação carrega junto um sentido de responsabilidade,           cuidar de si mesmo e de suas ações, e do outro ("ama a teu                     próximo...") e do mundo que espera pelos que virão.


                                                                                                (comentários de  Marcia R C Chemin)

 *o texto completo pode ser acessado em: <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/vladimirsafatle/2017/01/1853295-somos-livres-quando-somos-capazes-de-nos-abrir-ao-que-nao controlamos.shtml>

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